Tentando se esconder de si mesmas, diante das marcas físicas e psicológicas deixadas pela violência que sofreram, mulheres vítimas de abuso sexual pedem socorro. Desde que a pandemia modificou a rotina da sociedade, impondo o isolamento social como a maneira mais eficaz de impedir a disseminação acelerada do coronavírus, os casos de violação física de meninas e jovens cresceram em todo o mundo. No balanço mais recente feito pelo Serviço de Atenção às Pessoas em Situação de Violência Sexual do Instituto Santos Dumont (ISD), em Macaíba, as notificações para esse tipo de crime aumentaram 160% de 2016 ao primeiro semestre deste ano. O número, porém, pode ser ainda maior. De janeiro a julho deste ano, conforme dados da Secretaria de Estado da Segurança Pública e da Defesa Social (Sesed/RN), 233 mulheres foram estupradas em todo o território potiguar.
“As notificações aumentaram. Havia muita subnotificação. Elas oscilam, mas sempre acima do número do início do serviço de acolhimento de vítimas de violência sexual no Anita. No Município de Macaíba também aumentou. Nós iniciamos um trabalho em rede e incentivamos a notificação nas Unidades de Pronto-Atendimento, nas Unidades Básicas de Saúde que não notificavam esses casos”, afirma a preceptora multiprofissional em Assistência Social do ISD, Alexandra Lima. Uma das unidades do Instituto, o Centro de Educação e Pesquisa em Saúde Anita Garibaldi (Anita), é referência em Macaíba e distritos para o recebimento de crianças e mulheres violentadas sexualmente.
No Rio Grande do Norte, conforme dados analisados pelo ISD solicitados à Secretaria de Estado da Segurança Pública e da Defesa Social (Sesed/RN), o quantitativo de pessoas do sexo feminino que sofreram ameaças saltou 73% – de 2.183 para 3.777 – de janeiro a julho deste ano em relação ao mesmo intervalo de 2020. O total de lesões corporais nas mulheres teve crescimento de 1,47% (de 1.697 para 1.722). Os feminicídios caíram 18% (de 11 para 9). Os homicídios dolosos contra mulheres recuaram 13,89% (de 36 para 31). Os casos de estupro de vulnerável aumentaram 5,59% – 143 mulheres foram violentadas sexualmente contra 151 no mesmo intervalo deste ano.
Conforme dados do ISD, ao longo de todo o ano de 2016 – quando o serviço foi iniciado no Anita – foram notificados cinco casos. No primeiro semestre deste ano, o número já estava em 13 notificações. A maioria das vítimas tem menos de 10 anos de idade, são do sexo feminino e foram violentadas por parentes próximos (pais, irmãos, primos, padrastos e amigos da familia). Além da violência sexual, essas vítimas também sofrem outros abusos. “Chama atenção a quantidade de pessoas que sofrem violência psicológica e, por isso, não denunciam. Houve um aumento, em todas as faixas de idade, de casos de violência sexual. Eles acontecem em um quadro elevado e tem como consequência a ansiedade, a depressão…”, ressalta Alexandra Lima.
O trabalho em conjunto desenvolvido pelos profissionais do Instituto Santos Dumont em parceria com a Prefeitura Municipal de Macaíba ampliou o número de registros de casos de violação sexual no município. A orientação continuada e técnica dos profissionais de saúde, da segurança pública e da rede de assistência social foi fundamental. Além disso, a atuação da Vigilância Epidemiológica que orienta e coordena os serviços a fazerem as notificações permitiu uma maior efetividade das políticas de acolhimento e tratamento das vítimas desse tipo de crime, com consequente encaminhamento dos casos às Polícias Civil e Militar.
Dados do Anuário Brasileiro da Segurança Pública, divulgados em julho deste ano, apontam que ao longo de 2020, o primeiro ano da pandemia, “230.160 mulheres denunciaram um caso de violência doméstica em 26 UF, sendo o Ceará o único estado que não informou. Isto significa dizer que, ao menos 630 mulheres procuraram uma autoridade policial diariamente para denunciar um episódio de violência doméstica”.
Sinais
As vítimas de violência sexual, principalmente as crianças, por mais que não expressem os tabus verbalmente aos pais ou responsáveis, emitem sinais de que há algo errado. É preciso estar atento para que o crime não se repita e a vítima seja acolhida e tratada o mais rápido possível. Além disso, o caso deve ser comunicado à Polícia, ao Conselho Tutelar ou ao Ministério Público do Estado para providências constitucionais contra o criminoso.
“Os primeiros sinais são as mudanças comportamentais. O retorno ao xixi na cama, a aversão a estar na presença de determinada pessoa, de não querer ir para algum lugar no qual estará determinada pessoa, determinado adulto. Mesmo que a criança não diga em palavras que a pessoa cometeu um abuso, ela expressa com sinais de resistência ao contato físico, de modificação na alimentação e no sono. São mudanças comportamentais, e quem convive com a criança vai perceber que tem uma diferença. As crianças resistirão a ir à casa dos avós e dos tios, por exemplo. Os supostos agressores são todas pessoas conhecidas. Se não são da família, são próximas da família e das crianças”, declara Alexandra Lima.
Acolhimento
O Centro de Educação e Pesquisa em Saúde Anita Garibaldi (Anita) é unidade de referência no Município de Macaíba para o acolhimento, notificação e tratamento de vítimas de violência sexual. Funciona de portas abertas, com recebimento de demandas espontâneas ou pacientes encaminhados pela rede (UPA, UBS, CREAS). Conheça abaixo o fluxo de acolhimento desenvolvido no Anita para pessoas vítimas de violações sexuais.
Atendimento inicial com equipe formada por psicólogo, assistente social e enfermeiro;
Identificação das demandas. A equipe avalia a vítima e identifica se há necessidade de avaliação médica, pediátrica ou ginecológica, se deve ser feito uso de quimioprofilaxia, se a em situação é aguda e ocorrida em menos de 72 horas;
Em alguns casos, são realizados testes rápidos para identificação de contaminação por HIV, sífilis e hepatites;
Dependendo da situação, é administrada medicação para evitar contaminação pelas Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST);
Montagem de esquema para para acompanhamento de saúde com profissional de Psicologia, orientações sociais, comunicação ao Conselho Tutelar e Centro de Referência Especializado em Assistência Social (CREAS), caso a vítima procure diretamente o Anita;
Realização de novos testes rápidos em 30 dias e 90 dias;
Dispensação de medicação para quimioprofilaxia ao longo de 28 dias e retorno para avaliação de médico infectologista e farmacêutica;
Acompanhamento psicológico;
O sigilo de todo o processo é garantido.
Tipos de violência
Quais os tipos de violência doméstica e familiar contra a mulher?
A Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006) define cinco formas de violência doméstica e familiar. São elas:
Violência física: ações que ofendam a integridade ou a saúde do corpo como: bater ou espancar, empurrar, atirar objetos na direção da mulher, sacudir, chutar, apertar, queimar, cortar ou ferir;
Violência psicológica: ações que causam danos emocionais e diminuição da autoestima, ou que visem degradar ou controlar seus comportamentos, crenças e decisões; mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir, ou qualquer outro meio que cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
Violência sexual: ações que forcem a mulher a fazer, manter ou presenciar ato sexual sem que ela queira, por meio de força, ameaça ou constrangimento físico ou moral;
Violência patrimonial: ações que envolvam a retirada de dinheiro conquistado pela mulher com seu próprio trabalho, assim como destruir qualquer patrimônio, bem pessoal ou instrumento profissional;
Violência moral: ações que desonram a mulher diante da sociedade com mentiras ou ofensas. É, também, acusá-la publicamente de ter praticado crime. São exemplos: xingar diante dos amigos, acusar de algo que não fez e falar coisas que não são verdades sobre ela para os outros.
Serviço
Como denunciar casos de exploração sexual ou violência doméstica:
Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180
O Ligue 180 é um serviço de utilidade pública essencial para o enfrentamento à violência contra a mulher. Além de receber denúncias de violações contra as mulheres, a central encaminha o conteúdo dos relatos aos órgãos competentes e monitora o andamento dos processos.
O serviço também tem a atribuição de orientar mulheres em situação de violência, direcionando-as para os serviços especializados da rede de atendimento. No Ligue 180, ainda é possível se informar sobre os direitos da mulher, a legislação vigente sobre o tema e a rede de atendimento e acolhimento de mulheres em situação de vulnerabilidade
Disque Direitos Humanos – Disque 100
Atende denúncias de violações de crianças e adolescentes, pessoas idosas, pessoas com deficiência, pessoas em restrição de liberdade, população LGBT e população em situação de rua. O serviço também está disponível para denúncias de casos que envolvam discriminação étnica ou racial e violência contra ciganos, quilombolas, indígenas e outras comunidades tradicionais.
190 – Centro Integrado de Operações de Segurança Pública do Rio Grande do Norte
127 – Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte
Texto: Ricardo Araújo / Ascom – ISD
Foto: Mariana Ceci / Ascom – ISD
Assessoria de Comunicação
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(84) 99416-1880
Instituto Santos Dumont (ISD)
É uma Organização Social vinculada ao Ministério da Educação (MEC) e engloba o Instituto Internacional de Neurociências Edmond e Lily Safra e o Centro de Educação e Pesquisa em Saúde Anita Garibaldi, ambos em Macaíba. A missão do ISD é promover educação para a vida, formando cidadãos por meio de ações integradas de ensino, pesquisa e extensão, além de contribuir para a transformação mais justa e humana da realidade social brasileira.