A identificação da discalculia veio de forma tardia para Larissa Pessoa, psicóloga e residente na Residência Multiprofissional no Cuidado à Saúde da Pessoa com Deficiência (RESPCD) do Instituto Santos Dumont (ISD). Diagnosticada aos 16 anos, Larissa reflete sobre suas dificuldades no período em que não sabia sobre a existência do transtorno. Na escola, por exemplo, era boa em literatura, história, geografia e ciências – tudo que, segundo ela, envolvesse o mínimo de matemática o possível – mas era constantemente submetida ao sentimento de que não se esforçava o suficiente e tinha suas dificuldades interpretadas como uma falta de comprometimento.
No dia 3 de março, acontece o Dia Internacional da Discalculia, transtorno específico da aprendizagem caracterizado principalmente por uma dificuldade persistente no processamento numérico, cálculos básicos e raciocínio lógico.
“Eu tentava a todo custo ser boa nos âmbitos de cálculo e matemática e não conseguia. Só depois do diagnóstico, entendi que era uma via de mão dupla e que não era só eu que tinha que construir isso. Comecei a partir daí, junto à psicóloga, o processo de sensibilizar os meus pais para buscar o acompanhamento, a avaliação neuropsicológica, que foi um processo bem difícil, mas funcionou”, conta a residente.
Larissa reforça que as dificuldades, na época do diagnóstico, não se limitavam à sala de aula, mas se misturavam a todas as atividades do dia-a-dia. Por exemplo, eram comuns momentos em que se machucava por não ter noção de espaço, ou que se perdia por não ter uma noção de sequência dos lugares pelos quais passava.
Atualmente, a residente ressalta que sente muito menos dificuldade nesses aspectos, e que o diagnóstico e subsequente implementação de estratégias possibilitam o acesso a vários espaços e facilitam sua adaptação na sociedade.
“O diagnóstico mudou minha vida, por que tive acesso ao conhecimento de perceber que sou diferente e que isso não me faz menor: me faz cheia de potencialidades e algumas fragilidades também, como todo mundo. Ganhei uma luta, mas ganhei também amigos, colegas e companheiros na luta pela inclusão”, pontua Larissa.
Hoje em dia, Larissa atua nas redes sociais em um perfil voltado para ser um “diário de bordo”, narrando a vivência de uma pessoa com discalculia, buscando informar, compartilhar dificuldades, estratégias e conquistas.
Diagnóstico e acompanhamento são fundamentais
A discalculia é classificada na categoria de transtorno específico da aprendizagem por não se tratar apenas de uma dificuldade na matemática, mas algo persistente, ou seja, que acompanha a pessoa diagnosticada durante toda a vida. A preceptora neuropsicóloga Caroline Leôncio, do ISD, explica como se identifica a discalculia e quais atitudes e estratégias podem ser trabalhadas na rotina da pessoa diagnosticada com o transtorno.
Os sinais da discalculia podem ser percebidos desde cedo, sendo a escola o maior local de evidência de que esse transtorno pode aparecer, por exigir mais frequentemente o conhecimento matemático de crianças e adolescentes. No entanto, essa percepção não necessariamente facilita um diagnóstico.
“A discalculia ainda é muito pouco conhecida dentre os outros transtornos de aprendizagem. Além disso, existe um fator cultural envolvendo a matemática nas escolas, que é o de enxergá-la como uma ‘vilã’, então as crianças acabam se retraindo naturalmente com esse tópico”, explica a profissional.
Assim como outros transtornos do neurodesenvolvimento, a discalculia não tem marcadores biológicos, sendo o diagnóstico essencialmente clínico, conduzido por critérios comportamentais e de exclusão. Por exemplo, é necessário descartar a possibilidade da dificuldade com a matemática ser relacionada ao método educacional, a uma falta de assistência ou à presença de deficiências intelectuais ou sensoriais na criança.
Intervenção multidisciplinar
De acordo com a neuropsicóloga Caroline Leôncio, não há cura para a discalculia, mas a avaliação neuropsicológica somada à avaliação multidisciplinar com um pedagogo, são fundamentais na melhoria da qualidade de vida e inclusão social de pessoas diagnosticadas com o transtorno.
Alguns dos exemplos de estratégias e adaptações curriculares que podem ser adotadas, em um trabalho conjunto com a equipe escolar, são a inserção de textos e outros recursos não numéricos, sempre que possível, ajustes na apresentação de gráficos e números, e a inserção de materiais visuais, dentre muitas possibilidades.
A neuropsicóloga reforça que a capacitação de profissionais da educação e pessoas do convívio para lidar com transtornos do neurodesenvolvimento e, a partir dos sinais precoces, conseguirem identificá-los e providenciar o devido encaminhamento é um dos passos para se conseguir uma maior visibilidade do transtorno.
O tratamento, segundo Caroline, varia de pessoa para pessoa, visto que cada uma possui diferentes potencialidades e necessidades. “É importante um plano de intervenção individualizado, que considere as potencialidades cognitivas, os interesses e as necessidades de cada pessoa, além dos fatores culturais, sociais e emocionais. É necessário compreender os pontos de força no funcionamento neuropsicológico de cada sujeito, para ser possível a proposição de estratégias que compensem e minimizem as dificuldades”, finaliza a profissional.
Texto: Naomi Lamarck / Ascom – ISD
Foto: Naomi Lamarck / Ascom – ISD
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Instituto Santos Dumont (ISD)
É uma Organização Social vinculada ao Ministério da Educação (MEC) e engloba o Instituto Internacional de Neurociências Edmond e Lily Safra e o Centro de Educação e Pesquisa em Saúde Anita Garibaldi, ambos em Macaíba. A missão do ISD é promover educação para a vida, formando cidadãos por meio de ações integradas de ensino, pesquisa e extensão, além de contribuir para a transformação mais justa e humana da realidade social brasileira.