Violações de direitos das mulheres crescem 205% no Rio Grande do Norte

Publicado en 9 de marzo de 2022

Violação à integridade física, psicológica, dos direitos sociais e da vida. Enquanto o mundo celebra o Dia Internacional da Mulher neste 8 de março, o Brasil e o Rio Grande do Norte  registram aumento significativo de casos de violações de diversos direitos das mulheres. Na passagem de 2020 para 2021, em todo o país, conforme registros do Painel de Dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos (ONDH), tabulados pelo Instituto Santos Dumont (ISD), o número de delitos em desfavor de pessoas do sexo feminino cresceu 203,29% – de 271.392 para 823.127. No Estado potiguar, a alta é similar: 205,02%. Em números absolutos: de 5.198 para 15.855 violações. Chama a atenção o quantitativo de feminicídios ocorridos no Rio Grande do Norte desde o dia 1º de janeiro até hoje: oito. 

Esse número corresponde a um assassinato de mulher a cada 8 dias, considerando 1º de janeiro a 7 de março. De janeiro a dezembro de 2021 foram registradas 13 ocorrências dessa natureza em todo o território norte-riograndense, contra 20 no ano anterior, segundo a Polícia Civil. Os casos mais recentes registrados em Natal e Parnamirim, com diferença de aproximadamente 10 dias entre eles, chocaram a população pelo assassinato de duas mulheres por seus ex-companheiros que não aceitavam o processo de separação. Ambos cometeram suicídio após matarem as mulheres com as quais dividiram anos de suas vidas. Uma delas morreu diante da mãe e das filhas.

Conforme dados da ONDH, registrados através das ligações efetuadas para o Disque 180 – Central de Atendimento à Mulher, o Rio Grande do Norte somou, em 2021, um número de denúncias 103,94% maior que o ano imediatamente anterior. Especialistas apontam que a pandemia e a necessidade de isolamento social como medida mais eficaz contra o avanço da covid-19 ampliou o tempo de permanência de agressor e vítima sob o mesmo ambiente e, como consequência, a ocorrência de mais casos de violência doméstica, principalmente. Os homens responderam por 59,41% das denúncias reportadas. A maioria dos casos ocorre dentro da casa dividida pelo agressor e vítima. Pelo menos 9.487 violações, que incluem quaisquer atos que atentem ou violem os direitos humanos de uma vítima, se deram nesses ambientes em 2021. Outros 4.544, dentro da casa da própria vítima.

O aumento das denúncias, conforme a preceptora multiprofissional psicóloga do Instituto Santos Dumont (ISD), Carla Glenda Souza da Silva, tem um lado positivo. “Mais mulheres passaram a se mostrar através das redes sociais e a usá-las como canal de denúncia de maus tratos, agressões, ameaças, violência doméstica. As pessoas estão tendo mais acesso aos canais de denúncias e isso é muito importante. Mas ainda há muito medo. Muitas mulheres têm parceiros agressores envolvidos em atividades ilícitas, por exemplo”, afirma a psicóloga, que é doutora em Ciências da Saúde pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). 

No detalhamento das violações, quase um terço das reportadas ao longo de 2021 se deram por um prazo de tempo superior a um ano. Ou seja, muitas mulheres sofreram abusos diversos e se mantiveram caladas por anos. “Há uma questão emocional e cultural dos agressores, que já trazem consigo um machismo. De achar que a mulher é propriedade, que a mulher não tem valor ou não dá o merecido valor a essa mulher dentro do ambiente familiar”, aponta Carla Glenda como possíveis razões para manutenção do ciclo de violência doméstica. A maioria das violações detalhadas ao ONDH, 14.203, atentaram contra a integridade física das mulheres potiguares. 

Denúncia

A Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180 presta uma escuta e acolhida qualificada às mulheres em situação de violência. O serviço registra e encaminha denúncias de violência contra a mulher aos órgão competentes, bem como reclamações, sugestões ou elogios sobre o funcionamento dos serviços de atendimento.

O serviço também fornece informações sobre os direitos da mulher, como os locais de atendimento mais próximos e apropriados para cada caso: Casa da Mulher Brasileira, Centros de Referências, Delegacias de Atendimento à Mulher (Deam), Defensorias Públicas, Núcleos Integrados de Atendimento às Mulheres, entre outros.

A ligação é gratuita e o serviço funciona 24 horas por dia, todos os dias da semana. São atendidas todas as pessoas que ligam relatando eventos de violência contra a mulher.

O Ligue 180 atende todo o território nacional e também pode ser acessado em outros países.

Violência em números

Veja abaixo a evolução da violência contra a mulher no Brasil e Rio Grande do Norte:

Brasil

2021

198.275 denúncias

823.127 violações

2020

101.964 denúncias

271.392 violações

Diferença 2020 x 2021: 551.735 violações a mais (203,29% de aumento)

Rio Grande do Norte

2021

3.773 denúncias

15.855 violações

2020

1.850 denúncias

5.198 violações

Diferença 2020 x 2021: 10.657 violações a mais (205,02% de aumento)

Frequência das violações

Diária: 10.512

Ocasional: 1.898

Semanal: 1.607

Única: 1.373

Mensal: 239

Não detalhado: 226

Denúncia: quantidade de relatos de violação de direitos humanos envolvendo uma vítima e um suspeito. Uma denúncia pode conter uma ou mais violações de direitos humanos.

Violação: qualquer fato que atente ou viole os direitos humanos de uma vítima. Exemplos: maus tratos, exploração sexual, tráfico de pessoas. 

Fonte: Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos

Entrevista

“A mulher precisa se dar uma oportunidade”

Carla Glenda Souza da Silva, psicóloga do ISD

É possível traçar o perfil dos agressores das mulheres no Rio Grande do Norte?

O perfil dos agressores é muito ligado à insegurança com relação ao fim do relacionamento, a não se considerar homem suficiente para manter a família. Hoje em dia, a gente vê muito forte a questão do limiar da frustração. As pessoas não aceitam serem frustradas em seus desejos. Isso é sinônimo de fracasso e ninguém quer ser fracassado. Não aceita término de relacionamento, não aceita não ser mais querido naquela relação, não percebe que tem comportamentos que são nocivos à relação seja com a parceira atual ou com qualquer outra. 

Como isso ocorre?

São homens que, em geral, já vem de outros relacionamentos frustrados onde, de repente, imperava o abuso físico e psicológico. E, nessa relação, quando a mulher se coloca um pouco mais empoderada, surge a violência, surge o ato violento de chegar a matar.

Quais sinais podem ser identificados no comportamento, atitudes do agressor?

É possível identificar alguns sinais, tais como: a necessidade de controle, o isolamento dos seus pares, familiares e amigos; o comportamento de desqualificar a pessoa na frente de outros amigos e familiares. Isso, cada vez mais, fazendo com aquele cônjuge vá se sentindo ruim ao ponto dele se afastar ou se isolando por ela não se sentir boa o suficiente ou não conseguir suprir as expectativas do parceiro. O parceiro joga isso para a vítima o tempo inteiro em atitudes, falas, exposição na frente de terceiros. A vítima se sente, cada vez mais, subjugada e se submete.

As mulheres que estão na posição de vítima, como podem se fortalecer e denunciar?

É muito difícil. A mulher precisa perceber, primeiro, que o relacionamento não é legal. Ela precisa se dar oportunidade de reconhecer que determinados atos daquele parceiro não são adequados para a convivência positiva do relacionamento. Isso não é fácil, porque por mais que ela perceba, as situações sociais, as questões emocionais, a convivência conflituosa com familiares vão favorecendo com que esse relacionamento vá se consolidando e fica muito mais difícil sair da relação depois de um tempo envolvida. Não é impossível, mas ela precisa se dar uma oportunidade.  

Consultoría de comunicación
comunicacao@isd.org.br
(84) 99416-1880

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Esse número corresponde a um assassinato de mulher a cada 8 dias, considerando 1º de janeiro a 7 de março. De janeiro a dezembro de 2021 foram registradas 13 ocorrências dessa natureza em todo o território norte-riograndense, contra 20 no ano anterior, segundo a Polícia Civil. Os casos mais recentes registrados em Natal e Parnamirim, com diferença de aproximadamente 10 dias entre eles, chocaram a população pelo assassinato de duas mulheres por seus ex-companheiros que não aceitavam o processo de separação. Ambos cometeram suicídio após matarem as mulheres com as quais dividiram anos de suas vidas. Uma delas morreu diante da mãe e das filhas.

Conforme dados da ONDH, registrados através das ligações efetuadas para o Disque 180 – Central de Atendimento à Mulher, o Rio Grande do Norte somou, em 2021, um número de denúncias 103,94% maior que o ano imediatamente anterior. Especialistas apontam que a pandemia e a necessidade de isolamento social como medida mais eficaz contra o avanço da covid-19 ampliou o tempo de permanência de agressor e vítima sob o mesmo ambiente e, como consequência, a ocorrência de mais casos de violência doméstica, principalmente. Os homens responderam por 59,41% das denúncias reportadas. A maioria dos casos ocorre dentro da casa dividida pelo agressor e vítima. Pelo menos 9.487 violações, que incluem quaisquer atos que atentem ou violem os direitos humanos de uma vítima, se deram nesses ambientes em 2021. Outros 4.544, dentro da casa da própria vítima.

O aumento das denúncias, conforme a preceptora multiprofissional psicóloga do Instituto Santos Dumont (ISD), Carla Glenda Souza da Silva, tem um lado positivo. “Mais mulheres passaram a se mostrar através das redes sociais e a usá-las como canal de denúncia de maus tratos, agressões, ameaças, violência doméstica. As pessoas estão tendo mais acesso aos canais de denúncias e isso é muito importante. Mas ainda há muito medo. Muitas mulheres têm parceiros agressores envolvidos em atividades ilícitas, por exemplo”, afirma a psicóloga, que é doutora em Ciências da Saúde pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). 

No detalhamento das violações, quase um terço das reportadas ao longo de 2021 se deram por um prazo de tempo superior a um ano. Ou seja, muitas mulheres sofreram abusos diversos e se mantiveram caladas por anos. “Há uma questão emocional e cultural dos agressores, que já trazem consigo um machismo. De achar que a mulher é propriedade, que a mulher não tem valor ou não dá o merecido valor a essa mulher dentro do ambiente familiar”, aponta Carla Glenda como possíveis razões para manutenção do ciclo de violência doméstica. A maioria das violações detalhadas ao ONDH, 14.203, atentaram contra a integridade física das mulheres potiguares. 

Denúncia

A Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180 presta uma escuta e acolhida qualificada às mulheres em situação de violência. O serviço registra e encaminha denúncias de violência contra a mulher aos órgão competentes, bem como reclamações, sugestões ou elogios sobre o funcionamento dos serviços de atendimento.

O serviço também fornece informações sobre os direitos da mulher, como os locais de atendimento mais próximos e apropriados para cada caso: Casa da Mulher Brasileira, Centros de Referências, Delegacias de Atendimento à Mulher (Deam), Defensorias Públicas, Núcleos Integrados de Atendimento às Mulheres, entre outros.

A ligação é gratuita e o serviço funciona 24 horas por dia, todos os dias da semana. São atendidas todas as pessoas que ligam relatando eventos de violência contra a mulher.

O Ligue 180 atende todo o território nacional e também pode ser acessado em outros países.

Violência em números

Veja abaixo a evolução da violência contra a mulher no Brasil e Rio Grande do Norte:

Brasil

2021

198.275 denúncias

823.127 violações

2020

101.964 denúncias

271.392 violações

Diferença 2020 x 2021: 551.735 violações a mais (203,29% de aumento)

Rio Grande do Norte

2021

3.773 denúncias

15.855 violações

2020

1.850 denúncias

5.198 violações

Diferença 2020 x 2021: 10.657 violações a mais (205,02% de aumento)

Frequência das violações

Diária: 10.512

Ocasional: 1.898

Semanal: 1.607

Única: 1.373

Mensal: 239

Não detalhado: 226

Denúncia: quantidade de relatos de violação de direitos humanos envolvendo uma vítima e um suspeito. Uma denúncia pode conter uma ou mais violações de direitos humanos.

Violação: qualquer fato que atente ou viole os direitos humanos de uma vítima. Exemplos: maus tratos, exploração sexual, tráfico de pessoas. 

Fonte: Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos

Entrevista

“A mulher precisa se dar uma oportunidade”

Carla Glenda Souza da Silva, psicóloga do ISD

É possível traçar o perfil dos agressores das mulheres no Rio Grande do Norte?

O perfil dos agressores é muito ligado à insegurança com relação ao fim do relacionamento, a não se considerar homem suficiente para manter a família. Hoje em dia, a gente vê muito forte a questão do limiar da frustração. As pessoas não aceitam serem frustradas em seus desejos. Isso é sinônimo de fracasso e ninguém quer ser fracassado. Não aceita término de relacionamento, não aceita não ser mais querido naquela relação, não percebe que tem comportamentos que são nocivos à relação seja com a parceira atual ou com qualquer outra. 

Como isso ocorre?

São homens que, em geral, já vem de outros relacionamentos frustrados onde, de repente, imperava o abuso físico e psicológico. E, nessa relação, quando a mulher se coloca um pouco mais empoderada, surge a violência, surge o ato violento de chegar a matar.

Quais sinais podem ser identificados no comportamento, atitudes do agressor?

É possível identificar alguns sinais, tais como: a necessidade de controle, o isolamento dos seus pares, familiares e amigos; o comportamento de desqualificar a pessoa na frente de outros amigos e familiares. Isso, cada vez mais, fazendo com aquele cônjuge vá se sentindo ruim ao ponto dele se afastar ou se isolando por ela não se sentir boa o suficiente ou não conseguir suprir as expectativas do parceiro. O parceiro joga isso para a vítima o tempo inteiro em atitudes, falas, exposição na frente de terceiros. A vítima se sente, cada vez mais, subjugada e se submete.

As mulheres que estão na posição de vítima, como podem se fortalecer e denunciar?

É muito difícil. A mulher precisa perceber, primeiro, que o relacionamento não é legal. Ela precisa se dar oportunidade de reconhecer que determinados atos daquele parceiro não são adequados para a convivência positiva do relacionamento. Isso não é fácil, porque por mais que ela perceba, as situações sociais, as questões emocionais, a convivência conflituosa com familiares vão favorecendo com que esse relacionamento vá se consolidando e fica muito mais difícil sair da relação depois de um tempo envolvida. Não é impossível, mas ela precisa se dar uma oportunidade.  

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